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Post by Sergio Jacomino on Mar 13, 2016 18:39:20 GMT -3
No último dia 1/3 a Corregedoria Geral de SP aprovou parecer no sentido de se permitir a averbação de concessão de Lavra de água mineral concedida pela União. Averbação de área de proteção da fonte. Entendeu o órgão tratar-se de informação relevante que, a exemplo da concessão de lavra, deve ser publicizada O fundamento legal é o artigo 246 da Lei nº 6.015/73 e o Decreto-Lei 7.841/2015. Trata-se do Processo CG 167.910/2015, Bananal, dec. de 24/2/2016, DJe 1/3/2016, des. Manoel de Queiroz Pereira Calças, cuja ementa é a seguinte: REGISTRO DE IMÓVEIS - Lavra de água mineral concedida pela União - Averbação de área de proteção da fonte - Possibilidade - Informação relevante que, a exemplo da concessão de lavra, deve ser publicizada - Inteligência do artigo 246 da Lei nº 6.015/73 - Descrição de área de proteção cuja localização não é certa - Dúvida a respeito do avanço da área sobre outros imóveis - Afronta à especialidade objetiva - Recurso desprovido.A questão é assaz interessante. Anteriormente, a Vara de Registros Públicos e o próprio Conselho Superior da Magistratura haviam denegado o acesso de tais atos ao Registro. Confiram: - Exploração de lavra. Direito minerário. Minas. Direito de participação. (omissis) O elenco do art. 167, I, da Lei 6.015/73 é taxativo, não permitindo interpretação extensiva ou analógica. Os direitos previstos no Decreto de Lavra (Dec. 31.183, de 25/7/1952 deve ser objeto de registro no "Livro de Registros dos Decretos de Lavra" (art. 59, § 1°, do Código de Mineração - Dec. Lei n° 277/67) e não no Cartório de Registro de Imóveis. > AC 1.956-0, São Paulo, j. 13/6/1983, DJ 13/7/1983, rel. des. Bruno Affonso de André.
- Contrato de arrendamento rural - direitos de lavra. Rol taxativo.
> Processo 1VRPSP 261/1982, São Paulo, j. 16/04/1982, Dr. Narciso Orlandi Neto.
Adianto-lhes que há extensas considerações em Afrânio de Carvalho e Serpa Lopes, doutrina que oportunamente vamos visitar em artigo a ser veiculado no site Círculo Registral. Por ora, deixou consignado que, por várias razões, considero acertada a decisão proferida no Processo CG 167.910/2015. É necessário, contudo, dar bons fundamentos jurídicos - além dos que aqui se acham indicados. Submeto o tema à apreciação dos colegas. Sérgio Jacomino
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Post by Pedro H. M. Bragatto on Mar 20, 2016 11:51:29 GMT -3
Prezados, é realmente interessante questão trazida à balha pelo Dr. Sérgio. Pretendo aqui tentar buscar novos fundamentos e, se possível, humildemente, aprofundar os que já foram apresentados.
Um dos fundamentos apresentados no Processo CG 167.910/2015, advindo de Bananal, é o art. 246 da Lei 6.015/73. O mencionado artigo é o qual prescreve como rol exemplificativo as hipóteses de averbação contidas no art. 167, inc. II da Lei 6.015/73.
Neste diapasão se coloca o precedente constante no processo CG 167/2005, que traz rica doutrina para fundamentar a possibilidade deaverbação das áreas contaminadas (restrições ambientais) do qual extraímos trecho que cita o mestre Vicente de Abreu Amadei e informa que: "sendo o imóvel o centro em torno do qual gravitam os atos registrários, atingir-se-á em maior amplitude a finalidade à qual o registro imobiliário é destinado (segurança jurídica)quando maior for a concentração de informações existentes no fólio real relativas ao imóvel especificamente considerado, tenhamou não conotação protetivo-social ou urbanística, e, por outro lado, atingir-se-á maior eficácia no controle urbanístico da propriedade quanto maior for o vínculo entre os instrumentos da política de desenvolvimento urbano em atuação (afetando determinadas propriedades) e o registro predial.' (Anotações para uma reflexão sobre o aspecto instrumental do registro imobiliário no controle urbanístico da propriedade. Revista de Direito Imobiliário,Ns. 31/32, janeiro-dezembro de 1993, p. 22 e seguintes, especialmente p. 45-47)." Ademais, os dois precedentes contrários apontados (AC 1.956-0 e Processo 1VRPSP 261/1982) não trataram de hipótese de averbação, mas sim de registro, em sentido estrito. O registro, em sentido estrito, previsto no art. 167, inc. I da Lei 6.015 é taxativo. Considero importante ressaltar que existe uma jurisprudência sendo construída apontando justamente neste sentido: CSMSP - APELAÇÃO CÍVEL: 0035067.98.2010.8.26.0576 CSMSP - APELAÇÃO CÍVEL, LOCALIDADE: São José do Rio Preto DATA JULGAMENTO: 11/08/2011 DATA DJ: 10/10/2011 e CGJSP - PROCESSO: 215/2006 CGJSP - PROCESSOLOCALIDADE: Jundiaí DATA JULGAMENTO: 05/09/2006 DATA DJ: 06/10/2006 alémda já citada 167/2005. Isso não se traduz na possibilidade de se averbar todas as informações na matrícula, mas sim aquelas que tragam importantes efeitos sobre a propriedade, gerem de alguma forma uma "limitação" sobre a mesma (Proc. CG nº 57.115/2010 - (291/2010-E)).
Esses julgados ora apresentados trazem como fundamento a máxima amplitude do registro imobiliário com o objetivo de garantir a maior segurança jurídica.
Abstraindo ainda mais a questão, pode-se verificar aqui a aplicação do princípio da concentração da matrícula muito bem apontado pelo excelentíssimo Francisco Eduardo Loureiro no livro Lei de Registros Públicos Comentada, Coordenação José Manuel de Arruda Alvim Neto, página 1.280.
Interessante abordar também a Lei 13.097/15, em especial seu art. 54, que, apesar de apelidada de Lei da concentração da matrícula, traz inúmeros artigos não afetos ao direito registral ou mesmo notarial. Indo além, me questiono se tal averbação não estaria prevista no inciso III, do citado art. 54. Mesmo se considerarmos que a concessão de lavra não se enquadra perfeitamente na norma retro mencionada, pelo menos sob uma análise superficial e inicial, é importante a menção da mesma para demonstrar a intenção do legislador em promover o princípio da concentração.
Outro ponto que merece destaque é que apesar da Constituição da República afirmar no seu art. 176 que “as jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo” sobre o solo geram efeitos. Para a lavra é necessário perfurar o solo, ali colocar equipamentos para a exploração, conservação e transporte. A averbação traria publicidade sobre todos esses efeitos além de outros como o recebimento por parte do resultado da lavra pelo proprietário (§2º, art. 176, da CR), possibilidade de indenização por terceiros prejudicados e do proprietário, em determinados casos previstos no DECRETO-LEI Nº 227/67. É justamente em razão destes efeitos, que também considero acertada, pelo menos por ora, a decisão posta em debate. Os demais desdobramentos e questões dessa decisão resolvo deixar em aberto, pelo menos por hora, para escutar a opinião sempre abalizada, dos demais participantes deste fórum.
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Post by Rodrigo Pacheco Fernandes on Mar 20, 2016 22:40:15 GMT -3
Muito interessantes as colocações do Dr. Pedro, especialmente no que tange ao art. 54, inciso III da Lei 13.097/2015. Pergunto-me até que ponto o conceito de "limitações" presente naquele artigo abrangeria, além das limitações propriamente ditas (de cunho geral), também as servidões administrativas. Consultando a obra da professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro (Direito Administrativo. 24ª ed., São Paulo: Atlas, 2011, p. 152), encontrei os conceitos de limitação administrativa e de servidão. A primeira, de cunho genérico e pautado no poder de polícia, enquanto a segunda, de caráter individual, com o escopo de atender algum interesse público. Segundo a Professora Di Pietro (p. 150), as servidões em geral (tanto as de cunho civil, como as administrativas) caracterizam-se pela presença de três elementos: (a) constituição de direito real sobre coisa alheia, no qual alguns dos poderes do domínio se destacam e transferem-se a terceiros; (b) a situação de sujeição em que se encontra a coisa serviente em relação à coisa dominante ou a uma pessoa; e (c) o conteúdo da servidão caracterizado pela utilidade inerente à coisa serviente. Além disso, a citada autora distingue as servidões decorrentes da própria lei, as quais prescindem de registro, daquelas que devem constituir-se por acordo ou decisão judicial, que deverão agasalhar-se com a publicidade registral. Partindo destes conceitos, parece-me que a exploração de lavra, que poderá ocorrer por meio de concessão, tendo por característica a intervenção na propriedade privada, enquadra-se no conceito de servidão. Isto porque existem duas propriedades distintas (ainda que uma esteja "encravada"): (a) a das jazidas e demais recursos minerais (art. 176, caput, da CF); e (b) a do imóvel em que inseridas tais jazidas e recursos minerais. Penso que tal servidão não seja apenas "de passagem", pois implica na prática de diversos outros atos, como a perfuração do solo, permanência de funcionários, armazenamento dos recursos extraídos etc. Deixo os seguintes questionamentos: 1) Seria a servidão destinada à exploração de jazidas e demais recursos minerais uma servidão registrável (ato de registro stricto sensu), enquadrada no art. 167, inciso I, "6", da Lei de Registros Públicos? Enquadrando-se em tal dispositivo, seria necessário o acordo ou sentença judicial, conforme preceitua o Decreto-Lei 3.365/1941, em seu art. 40? 2) Por outro lado, podemos considerar não registrável tal servidão, sob o argumento de esta decorrer da própria lei (art. 176 da CF), com uma suposta "indenização" prevista no §2º do art. 176. Assim sendo, e considerando-se averbável sua existência, com base no art. 54, inciso III (interpretação extensiva do termo "limitações") e/ou art. 246 da LRP, seria necessária a notificação do proprietário do imóvel em que inseridas as jazidas ou recursos minerais?
Deixo abertos os debates e gostaria de saber a opinião dos colegas.
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caleb
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Post by caleb on Mar 21, 2016 14:35:18 GMT -3
A questão que me parece ser a principal é: qual o critério para que um certo direito seja inscritível?
Comparando o arrendamento e o direito de lavra: - nenhum dos dois precisa ser inscrito para ter validade perante terceiros; - nenhum dos dois tem sua força aumentada pela inscrição; - ambos poderiam ser (teoricamente) inscritos com a finalidade de dar conhecimento aos adquirentes do imóvel da situação jurídica atual.
Então, por que se permite a averbação da concessão de direito de lavra e não se permite do arrendamento?
A razão que consigo ver são os efeitos que decorreriam da inscrição.
A averbação ou registro da concessão de lavra somente dá conhecimento a terceiros de uma situação, em certo sentido, de fato. Embora a concessão seja um ato administrativo, para fins do Registro de Imóveis ela é um fato, simplesmente averbado na matrícula. Não há possibilidade de seu uso com a finalidade de simulação. Ela simplesmente existe por si própria, e sua inscrição somente daria notícia desta circunstância. Tem finalidade de publicidade.
Por outro lado, o registro ou a averbação do arrendamento daria conhecimento a terceiros de um contrato entre as partes. A finalidade não seria de dar conhecimento a terceiros de um fato, mas de trazer oponibilidade a um direito registrado. E esta oponibilidade poderia ser facilmente utilizada para fraudar terceiros.
Exemplifico: Imaginemos que Caio tem um imóvel rural e arrenda este imóvel, por um contrato, a Tício. Tício nunca entrou na posse do imóvel mas registrou este contrato junto à matrícula do imóvel rural (imaginando que isso fosse possível). Se, posteriormente, Caio arrenda o imóvel a Mévio, que não checou a matrícula do imóvel para verificar se já havia um arrendamento registrado, seria natural declarar que Mévio tem um direito com menor força do que o direito de Tício, sendo que este nunca entrou na posse do imóvel. Esta conclusão é contrária à natural ideia de que o arrendamento que resulta na transferência da posse prevalece frente a um arrendamento somente formalmente concluído.
Mévio teria sido prejudicado (aparentemente) por desconhecer a situação registral do imóvel. Por outro lado, se um terceiro fosse adquirir o imóvel, teria a impressão de que, com a concordância de Tício e Caio, estaria totalmente resguardado frente a possíveis oposições por parte de arrendantes. E, de fato, esta aparência não corresponde à realidade, porque o direito de Mévio, exercido na prática, é, este sim, superior.
Assim, o registro do arrendamento seria disfuncional: daria uma aparência de direito que não corresponde à realidade jurídica. Por outro lado, a averbação da concessão de lavra é totalmente funcional: torna mais cognoscível uma situação de fato que, demonstrada ou não, já é realidade efetiva.
Parece-me ser esta a razão da diferença e um dos principais critérios.
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